Ouça a segunda parte do depoimento de Costa à Justiça Federal
O ex-diretor de Refino e Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, preso em regime domiciliar no Rio, afirmou na quarta-feira (8), em depoimento à Justiça Federal do Paraná, que parte da propina cobrada de fornecedores da estatal era direcionada para atender a PT, PMDB e PP e foi usada na campanha eleitoral de 2010.
O portal G1 obteve o áudio no qual Costa diz ao juiz federal Sérgio Moro, responsável pelo processo da Lava Jato na primeira instância, que as diretorias comandadas pelos três partidos recolhiam propinas de 3% de todos os contratos. O ex-dirigente explicou como funcionava a divisão da propina entre as legendas partidárias.
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, divulgou nota na qual diz repudiar "com veemência e indignação" as declarações "caluniosas" de Paulo Roberto Costa. Na nota, Falcão diz que o PT "desmente a totalidade das ilações de que o partido teria recebido repasses financeiros originados de contratos com a Petrobras". Segundo Falcão, o partido estuda a adoção de medidas judiciais.
As assessorias de PP e PMDB informaram que os partidos não vão se manifestar enquanto não tiverem acesso aos autos do processo judicial.
O doleiro Alberto Youssef, que foi detido pela Operação Lava Jato, da PF, também deu depoimento à Justiça quarta-feira (8). Ele disse que o ex-presidente Lula teve de ceder à pressão de agentes políticos para nomear Paulo Roberto Costa.
A assessoria do Instituto Lula informou que o ex-presidente da República não comentará o conteúdo do áudio de Alberto Youssef, em razão de o processo estar na Justiça.
A Petrobras afirmou em nota que é reconhecida pelas autoridades como "vítima" no caso.
Propina
Segundo o ex-diretor, o PT recolhia para o seu caixa 100% da propina obtida em contratos das diretorias que a sigla administrava, como, por exemplo, as de Serviços, Gás e Energia e Exploração e Produção.
No depoimento desta quarta, Costa contou que, se o contrato era de uma diretoria que pertencia ao PP, o PT ficava com dois terços do valor e o restante era repassado para a legenda aliada.
"Olha, em relação à Diretoria de Serviços [comandada por Renato Duque], todos sabiam que 2%, dos 3% [cobrados de propina], eram para atender ao PT, através da Diretoria de Serviços. Outras diretorias, como Gás e Energia e Exploração e Produção, também eram PT. [...] O comentário é que, neste caso, os 3% ficavam diretamente para o PT porque eram diretorias indicadas PT com PT", declarou Costa à Justiça Federal.
Costa também afirmou ao juiz federal que o PMDB, que costumava indicar o diretor da área internacional da Petrobras, também obtinha uma parte do rateio da propina. Ele, no entanto, não detalhou qual o percentual que ficava com os peemedebistas.
"A diretoria internacional tinha indicação do PMDB. Então, tinha recursos que eram repassados para o PMDB, na Diretoria Internacional", afirmou.
Paulo Roberto Costa integrou a diretoria da Petrobras entre 2004 e 2012, nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Ele foi preso em março pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal, sob a acusação de integrar a quadrilha comandada pelo doleiro Alberto Youssef. Após fazer acordo de delação premiada com a Justiça, Costa foi autorizado a ficar em prisão domiciliar.
Durante o relato à Justiça Federal, Costa disse que foi indicado para a Diretoria de Refino e Abastecimento pelo Partido Progressista (PP). Segundo ele, o antigo líder da bancada do PP na Câmara José Janene – um dos réus do processo do mensalão –, teve influência na sua escolha para o cargo. Janene morreu, em 2010, antes de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal.
Paulo Roberto Costa explicou ao juiz federal que, até 2008, era Janene quem operava a fatia da propina que cabia ao PP. Segundo ele, a legenda ficava com um terço do valor dos contratos fechados pela diretoria de Refino e Abastecimento, que ele comandava. Os outros dois terços, relatou o ex-dirigente, eram repassados ao PT. Após a morte de Janene, Youssef passou a operar a propina do PP, informou Costa.
Da cota do PP, detalhou o ex-diretor, 60% eram repassados para a direção do partido, 20% eram usados para emitir notas fiscais e outros 20% eram divididos entre ele e Janene.
"Eu recebia em espécie, no shopping ou no escritório, depois que eu abri a consultoria."
O funcionamento do esquema
Ao longo do depoimento de uma hora e meia, Paulo Roberto Costa explicou com detalhes como funcionava o esquema de corrupção instalado na Petrobras. Segundo o ex-diretor, a operação teve início em 2006, quando, segundo ele, se formou um cartel entre grandes empreiteiras para prestação de serviços à Petrobras e para obras de infraestrutura, como a construção de hidrelétricas e aeroportos.
Em seu relato à Justiça, Paulo Roberto Costa citou o nome de 13 construtoras, entre as quais Odebrecht, Camargo Côrrea, OAS, Mendes Júnior, Queiroz Galvão e Andrade Gutierrez. De acordo com o ex-diretor, a propina paga aos políticos e funcionários da Petrobras era bancada pela empreiteiras.
Segundo ele, PT, PMDB e PP faziam indicações para cinco cadeiras da diretoria da Petrobras: Serviços, Exploração e Produção, Gás e Energia, Refino e Abastecimento e Internacional. Os diretores apadrinhados pelos partidos, observou Costa, eram os responsáveis por negociar o percentual das propinas nos contratos assinados pela estatal com os dirigentes das construtoras.
Em contrapartida, disse, as empresas asseguravam participação em contratos bilionários com a Petrobras, como a construção da Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco. Diante da suspeita de superfaturamento na obra, o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União passaram a investigar o empreendimento.
O doleiro Alberto Youssef, operador da propina pelo PP informou ao juiz federal que quem não pagava propina, não fechava contratos. "Ela [a empreiteira] ganhava a obra. Se ela não pagasse, tinha a ingerência política e do próprio diretor, que ela não fazia a obra se ela não pagasse", disse.
Do valor total do contrato assinado com as empreiteiras, segundo o relato de Costa, 3% eram superfaturados pelas próprias empresas para, posteriormente, pagar a propina aos partidos políticos.
Paulo Roberto Costa afirmou à Justiça que o dinheiro desviado da estatal chegou a abastecer campanhas eleitorais em 2010. "Na minha agenda, que foi apreendida, tem uma tabela que foi detalhada junto ao MP [Ministério Público]. E esta tabela revela valores de agentes políticos de vários partidos que foram relativos à eleição de 2010", disse o ex-diretor.
O doleiro e o ex-dirigente garantiram que o esquema de corrupção se estendeu ao longo de seis ano, sendo desmontado somente no momento em que Paulo Roberto Costa foi demitido, em 2012, no segundo ano de mandato da presidente Dilma Rousseff. Conforme os relatos dos dois, após a saída de Costa da estatal, ocorreram apenas pagamentos de saldos de contratos antigos.
Os dois réus da Lava Jato não puderam citar nomes de pessoas com foro privilegiado durante os depoimentos desta quarta à Justiça de primeira instância. Eles só poderão mencionar o papel que autoridades tiveram no esquema ao Supremo Tribunal Federal.
Advogados de ex-diretores contestam
Paulo Roberto Costa disse no depoimento que os ex-diretores Renato Duque (Serviços) e Nestor Cerveró (área internacional) participavam do suposto esquema de pagamento de propina montado na empresa, do qual ele próprio se beneficiava.
Segundo Costa, Duque foi indicado para o cargo pelo ex-ministro José Dirceu, condenado no processo do mensalão por corrupção ativa, e Cerveró, pelo PMDB.
Em nota enviada ao jornal, o advogado de Renato Duque, Alexandre Lopes de Oliveira, afirmou desconhecer o teor dos "inúmeros" depoimentos prestados por Paulo Roberto Costa. Ele disse que, caso o ex-diretor da Petrobras venha a acusar seu cliente por qualquer prática ilícita, ele "será responsabilizado no campo cível e criminal".
Segundo Oliveira, Renato Duque, que trabalhou por mais de 30 anos na Petrobras, "sempre pautou sua atuação na empresa pela correção e não admitirá injurias, difamações e calúnias em detrimento de sua honra."
"O patrimônio adquirido pelo sr. Renato Duque está devidamente declarado à Receita Federal e lastreado em anos e anos de trabalho", completa o comunicado da defesa de Duque.
Por telefone, o advogado de Nestor Cerveró, Edson Ribeiro, disse à TV Globo que a delação de Paulo Roberto Costa "não foi obtida de forma voluntária, como determina a lei". Para ele, esse é um "momento de muita cautela" e o ex-diretor da Petrobras deu uma declaração "sob pressão" para voltar para casa e ter penas e processos diminuídos.
Segundo Ribeiro, a Constituição estabelece que toda delação tem que ser feito de acordo com o devido processo legal e o Estado possui compromissos com os direitos de cada cidadão, entre eles, o "de ficar calado" para não produzir provas contra si mesmo. Por isso, segundo ele, as declarações devem ser analisadas "com cuidado".
"Quanto a Nestor Cerveró, em 2010, ele não estava mais na diretoria da Petrobrás. Ele saiu em 2008. Não tivemos acesso às denúncias feitas por Paulo Roberto Costa. Até hoje não existe qualquer investigação contra Cerveró. Quando houver alguma investigação, a defesa vai se manifestar", concluiu o advogado.
Tesoureiro do PT
Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef afirmaram em seus depoimentos, tomados separadamente pelo juiz federal, que o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, era o "operador" da cobrança de propina pelo partido.
Segundo Youssef, que, de acordo com a denúncia, também operava o esquema de corrupção montado dentro da Petrobras, ele se reuniu "uma ou duas" vezes com o tesoureiro petista para tratar da Petrobras. Indagado pelo magistrado sobre se Vaccari tinha conhecimento do esquema de cobrança de propina, o doleiro foi taxativo: "Com certeza".
Youssef também mencionou à Justiça Federal do Paraná que o lobista Fernando Soares, conhecido como "Fernando Baiano", operava a cota do PMDB no esquema de corrupção. Conforme o doleiro, Soares fazia a ponte entre a construtora Andrade Gutierrez com a Petrobras. O G1 não localizou o lobista Fernando Soares.
Em nota oficial, a Secretaria de Finanças do PT, da qual Vaccari é o titular, declarou que o dirigente petista nunca tratou de contribuições financeiras do partido, "ou de qualquer outro assunto", com Paulo Roberto Costa. Segundo o comunicado, o depoimento prestado por Costa "está carregado de afirmações distorcidas e mentirosas".
A nota informa que todos os que investiram contra a "honra e reputação" de Vaccari serão processados civil e criminalmente. "Essas acusações, difundidas insistentemente por meio de notícias na imprensa, sem possibilidade de acesso de nossos advogados aos depoimentos, impedem o direito ao exercício constitucional da ampla defesa. Reiteramos que as contribuições financeiras recebidas pelo PT são transparentes e realizadas sempre de acordo com a legislação em vigor", diz o comunicado.
Transpetro
Ao longo do depoimento à Justiça Federal, Paulo Roberto Costa foi questionado pelo magistrado sobre se o esquema de pagamento de propina também funcionava nas empresas subsidiárias da Petrobras. O ex-dirigente relatou ao juiz Sérgio Moro que ele tinha conhecimento que a Transpetro, empresa responsável pelo processamento de gás natural e transporte de combustíveis, também repassava propina a políticos. Eles disse ter recebido dinheiro das mãos do presidente da Transpetro, Sérgio Machado.
Segundo Costa, ele recebeu R$ 500 mil em razão de a diretoria de Refino e Abastecimento, que ele comandava, ter participado da contratação de navios para a Transpetro. Ainda de acordo com o ex-dirigente, a propina foi paga em dinheiro na casa de Machado, no Rio. Ele disse que não lembra quando ocorreu o negócio, mas que teria sido entre 2009 e 2010.
"[O dinheiro] foi entregue diretamente por ele [Machado], no apartamento dele no Rio de Janeiro", contou Costa.
Em nota oficial divulgada pela assessoria da Transpetro, Sérgio Machado negou "com veemência" as declarações de Paulo Roberto Costa a seu respeito. O presidente da subsidiária da Petrobras classificou o relato do ex-diretor de "mentirosas e absurdas".
O comunicado também diz que Machado estranhou o fato de as declarações terem sido divulgadas em pleno processo eleitoral. A assessoria informou que o dirigente da subsidiária "tomará todas as providências cabíveis, inclusive judiciais, para defender a sua honra e a imagem da Transpetro".
Empreiteiras
Leia abaixo o que disseram, por meio de notas, empreiteiras citadas nos depoimentos de Paulo Roberto Costa:
Camargo Côrrea/Consórcio CNCC (Camargo Corrêa e CNEC)
"Em relação aos referidos depoimentos, o CNCC repudia as acusações sem prova contra o consórcio e seus executivos. O contrato em questão foi conquistado em licitação de menor preço. O Consórcio CNCC reafirma ainda que não realizou nenhum pagamento ao Sr. Alberto Yousseff, nem a quaisquer de suas empresas e não pode responder por pagamentos efetuados por terceiros."
Odebrecth
“A Odebrecht nega veementemente as alegações caluniosas feitas pelo ex-diretor da Petrobras. A Odebrecht mantém, há décadas, contratos de prestação de serviços com a Petrobras, todos conquistados de acordo com a lei de licitações públicas. A Odebrecht repudia especialmente insinuações feitas a partir de menções a nomes de seus integrantes como sendo "contatos" do ex-diretor da Petrobras para supostas operações ilegais. Os executivos citados pelo réu confesso tiveram sim contatos com ele, com diretores, ex-diretores e também com membros do corpo técnico da Petrobras, mas apenas para tratar de assuntos estritamente profissionais, relacionados à execução de projetos para os quais a empresa foi contratada pela estatal. A empresa reitera que tem todo o interesse em que a verdade seja apurada com rigor - e está, como sempre esteve, à disposição das autoridades para qualquer esclarecimento.”
Queiroz Galvão
"A Queiroz Galvão informa que desconhece o teor dos depoimentos e reafirma que sua atuação no mercado atende rigorosamente à legislação."
Andrade Gutierrez
“A Andrade Gutierrez informa que as duas citações feitas à empresa nas gravações dos depoimentos do Sr. Paulo Roberto Costa e do Sr. Alberto Youssef deixam claro que não há qualquer envolvimento da companhia com os assuntos relacionados às investigações. No depoimento de Alberto Youssef, ele afirma categoricamente que não tinha qualquer contato com a Andrade Gutierrez ou qualquer um de seus executivos. No trecho do depoimento de Paulo Roberto Costa, ele cita o nome de um ex-funcionário da Andrade Gutierrez, que trabalhou por pouco tempo na empresa e que, por atuar no setor de óleo e gás, era natural que mantivesse contatos de trabalho com funcionários da Petrobras. A Andrade Gutierrez reitera que não tem ou teve qualquer envolvimento com os fatos relacionados com as investigações em curso e entende que o contexto das citações em que aparece o nome da empresa reforça esse posicionamento.”
Mendes Júnior
"A empresa não se pronuncia sobre inquéritos e processos em andamento."
Sanko Sider
“Os depoimentos que agora vêm a público corroboram o que afirmamos desde o início, palavra por palavra. Fortemente prejudicados, equivocadamente acusados, vítimas de ilações, acusações e afirmações levianas, nossa defesa na Justiça é séria, documentada e correta. A Sanko-Sider é uma empresa conceituada, regularmente constituída há 18 anos. Vende tubos de aço, flanges e conexões de alta qualidade a todos os segmentos do mercado, notadamente os especializados em óleo e gás. Todas as suas vendas se dão por meio de contratos legítimos; os pagamentos ocorrem pelo sistema bancário, contra notas fiscais devidamente contabilizadas e tributadas. Nossas normas de conduta sempre determinaram comportamento de respeito estrito às leis.”
A OAS não retornou as ligações para a reportagem.
(Fonte: Camila Bomfim, Marcelo Cosme e Lucas Salomão D a TV Globo e do G1)
Leia também:
No Ibope e no Datafolha, Aécio tem 46% e Dilma, 44%
Veja Mais noticias sobre Política