Solange Vicentini Tavares Mössenböck vai representar a cidade na categoria Literatura/ Conto e Crônica com a crônica ‘Com Meu Maiô Marca Dior Comprado em Montevidéu’.
Uma iniciativa da Secretaria de Estado da Cultura, realizado pela Abaçaí Cultura e Arte – Organização Social de Cultura, o Mapa Cultural visa identificar, valorizar e promover o intercâmbio da produção cultural no Estado de São Paulo e estimular a participação de seus municípios em atividades culturais. Esta edição contempla sete expressões artísticas: artes visuais, que compreende as expressões de artes plásticas, desenho de humor e fotografia; vídeo; canto coral; música instrumental; literatura, que compreende as expressões de conto, poema e crônica; dança e teatro.
Fase Municipal
A meta do Mapa Cultural Paulista é mapear a produção artística em todo Estado de São Paulo. Para representar a cidade na fase regional foram indicados artistas locais de destaque. Cinco deles participaram categoria Literatura. Os escritores foram indicados pela AEPTI – Associação dos Escritores Poetas e Trovadores de Itatiba. A cidade ainda contou com representantes nas categorias Desenho de Humor e Música Instrumental. As indicações foram submetidas a comissões formadas por membros da Câmara Temática de Cultura da RMC (Região Metropolitana de Campinas) que aprovou as escolhas. (Fonte: ACPMI)
Texto classificado:
Com meu maiô preto marca Dior comprado em Montevidéu.
Solange Vicentini T. Mössenböck
10/01/2011
“A senhora entrou no Cartório, decidida a registrar o documento elaborado há dias. Sentia-se aliviada, prestes a realizar os últimos preparativos elaborados para seu futuro próximo.
-Bom dia senhor! Eu trouxe estes documentos para serem avaliados, autenticados e averbados neste cartório.
-De que se trata senhora? Perguntou-lhe o senhor gordinho de óculos e mãozinhas brancas ridiculamente pequenas.
- Lendo, o senhor entenderá, respondeu a senhora sentando-se na cadeira não oferecida pelo funcionário.
Com cara de pouco caso, o homenzinho ajeitou os óculos na ponta do nariz para ler o documento datilografado em 3 vias.
Iniciou a leitura em voz alta, para que ela o acompanhasse e, paulatinamente, abaixou o volume até emudecer completamente, absorvido pelo inusitado texto do documento. O ar sarcástico foi substituído pelo de surpresa.
DOCUMENTO DE FÉ E VONTADE
Eu, Maria Eudóxia Pereira e Oliveira, nascida em 10 de abril de 1935 em Quixadá – Ceará, funcionária pública federal aposentada e em plena consciência destes escritos, tenho conhecimento da doença terminal que encurta meu tempo de vida, motivo de minha presença neste Cartório para registrar meus desejos neste documento.
Em testamento à parte estão os bens que acumulei e que deverão ser repartidos entre meus sobrinhos herdeiros.
Este documento que ora entrego ao 1º Cartório de Notas e Ofícios da cidade de São Paulo, expressa meus desejos, que devem ser adotados após meu falecimento:
(1º) Não quero comentários sobre meu passamento. Não quero notícias veiculadas em jornais ou panfletos de funerárias.
(2º) Não quero velório para dar chances a conversas entre meus falsos parentes e amigos. Não quero corja nenhuma em volta de meu caixão, comentando de minha vida e a alheia, juntamente com a com a farsa dos cumprimentos, lágrimas e olhares curiosos.
(A última noíicia que recebi de um sobrinho, deu-se há seis anos. Infelizmente para ele, eu estava muito bem de saúde naquela época, pensou Eudóxia com ressentimento)
(3º) Para respeitar a legislação sanitária póst-mortem, solicito que o meu corpo seja guardado em caixão resfriado na Morgue Municipal e retirado apenas no momento do enterro.
(4º) Quero ser vestida unicamente com meu maiô preto comprado em Montevidéu em 1970, da marca Dior.
(Com a etiqueta original. Uma preciosidade ! Modéstia à parte, ficava linda naquele maiô. Realçava minha cintura e o busto, resultando um ar nobre que só Dior sabia desenhar.Que saudades daqueles tempos gloriosos!)
(5º) Nada nos pés.
(Não vou enterrar comigo meus sapatos caros, além de que, maiô e sapatos sociais não combinam. É de mau gosto!)
(6º) Nada de jóias. Não darei chance aos ladrões de túmulos violarem meu caixão.
(Ficarão, por herança, aos meus sobrinhos, ladrões ordinários que já conheço).
(7º) Quero ser bem maquilada, penteada e perfumada. Um lindo ramo de orquídeas nas mãos e mais nada. Nenhuma flor escondendo minhas pernas e pés. Somente o maravilhoso maiô preto Dior inteiramente à mostra.
(Pena que o decote maravilhoso das costas não estará visível)
(8º) Ao sair da Morgue quero ser acompanhada unicamente pelos funcionários locais. Não quero missa de sétimo dia ou em tempo algum.
(Morta, acabou. Cheguei a esta idade sem missas e nunca freqüentei igrejas, portanto, dispenso qualquer ritual religioso.)
(9º) Que seja oferecida aos coveiros e funcionários da Morgue, uma caixa de cerveja bem gelada após o serviço, pelo trabalho honesto que enfrentaram para enterrar esta velha dura que soube aproveitar todas as boas coisas da vida sem falsos pudores e sem submissões. Neste documento expresso minha vontade. Que seja autenticado em cartório e distribuído a meus gananciosos sobrinhos que aguardam minha morte.
Meu maiô preto da marca Dior comprado em Montevidéu e usado nos momentos maravilhosos ao lado do mais querido amante de minha vida, será meu companheiro até o final de toda minha historia. Com a sabedoria adquirida na vida preciosa que eu soube desfrutar, estes são meus desejos.
São Paulo, 10 de janeiro de 2011,
Maria Eudóxia Pereira e Oliveira
RG 20642-1 – SSPCE”
As
opiniões expressas nos artigos são de responsabilidade
pessoal do autor e não representam necessariamente a posição
do NJNews ou de seus colaboradores diretos.
Veja Mais noticias sobre Cultura