Detalhes do acordo foram veiculados pelo site da revista "Istoé", que publicou reportagem com trechos dos termos de delação. A informação de que Delcídio fechou acordo de delação premiada foi confirmada à Folha por pessoas próximas às investigações da Lava Jato.
De acordo com os documentos publicados pela revista, o senador também diz que Dilma Rousseff usou sua influência para evitar a punição de empreiteiros, ao nomear o ministro Marcelo Navarro para o STJ (Superior Tribunal de Justiça). O ministro Teori Zavascki, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidirá se homologa ou não a delação.
A principal preocupação do Planalto vai ser explicar as citações a Dilma, não a Lula. Auxiliares da presidente dizem que é o petista quem deve cuidar de sua defesa, não o governo.
Em seu relato, Delcídio cita outros senadores e deputados, tanto da base aliada quando da oposição. Segundo a publicação, o senador petista revelou que Dilma tentou três vezes interferir na Lava Jato com a ajuda do ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. "É indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de tentar promover a soltura de réus presos no curso da referida operação", afirmou.
O senador diz, segundo a revista, que a terceira investida de Dilma contra a Lava Jato foi a nomeação de Navarro para o STJ. "Tal nomeação seria relevante para o governo", pois o nomeado cuidaria dos "habeas corpus e recursos da Lava Jato no STJ", conta Delcídio.
Anteriormente, afirma a reportagem, a petista tentou influenciar o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e buscou um acordo com o presidente do TJ de Santa Catarina, Nelson Schaefer. O catarinense seria nomeado para o STJ se o juiz substituto na corte Newton Trisotto, também de Santa Catarina, votasse pela libertação dos empreiteiros.
De acordo com a revista, Delcídio diz que Lula pediu "expressamente" para que ele ajudasse o pecuarista José Carlos Bumlai porque o empresário estaria implicado nas delações de Fernando Baiano e Nestor Cerveró. Para o senador, Bumlai tinha "total intimidade" e exercia o papel de "consigliere" da família Lula, expressão em italiano que remete aos conselheiros dos chefes da máfia italiana. "No caso, Delcídio intermediaria o pagamento de valores à família de Cerveró", afirma o acordo de delação.
Na conversa com o ex-presidente, de acordo com outro trecho da delação, Delcídio diz que "aceitou intermediar a operação", mas lhe explicou que "com José Carlos Bumlai seria difícil falar, mas que conversaria com o filho, Maurício Bumlai, com quem mantinha boa relação".
Depois de receber a quantia de Maurício Bumlai, a primeira remessa de R$ 50 mil foi entregue em mãos pelo próprio Delcídio ao advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, também preso pela Lava Jato e solto em 24 de fevereiro.
Delcídio passou quase três meses preso por determinação do STF após ser gravado por um filho de Cerveró tramando a fuga do ex-diretor da Petrobras. Ele foi solto em 19 de fevereiro e a seguir pediu licença médica do Senado. Na negociação do acordo, conforme informou a Folha em fevereiro, Delcídio se mostrou disposto a implicar senadores do PSDB. O senador presidiu em 2005 a CPI dos Correios, que investigou o escândalo do mensalão.
CARF
Em seu relato no acordo, Delcídio afirma, ainda segundo a revista, que uma das maiores preocupações de Lula é a CPI do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), já que as investigações podem atingir os filhos do ex-presidente, Fábio Luiz Lula da Silva e Luiz Claudio Lula da Silva.
O senador conta que várias vezes foi convocado por Lula para evitar a convocação de Mauro Marcondes e Cristina Mautoni para depor. De acordo com o relatório da Lava Jato, como líder do Senado, Delcídio "mobilizou a base do governo para derrubar os requerimentos de convocação do casal".
Em outro trecho sobre o ex-presidente, o senador afirma que o silêncio do publicitário Marcos Valério, pivô do escândalo do mensalão, foi comprado e diz que o assunto foi discutido com Paulo Okamotto, atual presidente do Instituto Lula. O pagamento, inicialmente estimado em R$ 220 milhões, mais adiante ficou sob "a responsabilidade" do ex-ministro Antônio Palocci.
PASADENA
Uma das partes mais contundentes do acordo aborda a compra da refinaria de Pasadena, no Texas, pela Petrobras. O depoimento, diz a "Istoé", afirma que Dilma, como presidente do Conselho de Administração da Petrobras, tinha "pleno conhecimento" do processo de aquisição da unidade e "de tudo que esse encerrava".
A compra da refinaria gerou prejuízo milionário à Petrobras e foi alvo da 20ª fase da Lava Jato, chamada de "Corrosão".
A revista afirma que Dilma atuou de maneira decisiva para que Cerveró fosse mantido no cargo de diretor da área Internacional da Petrobras, em 2008. Ele acabou sendo realocado em uma diretoria da estatal BR Distribuidora.
REPERCUSSÃO
Após uma reunião com Lula, o presidente do PT, Rui Falcão, disse nesta quinta que, se confirmados, os termos da delações de Delcídio "não merecem credibilidade". "Se é que ele fez essas declarações, não merecem credibilidade. Porque nunca o ex-presidente Lula fez tratativas como as mencionadas, tampouco a presidente Dilma", afirmou.
Falcão fez questão de frisar que Delcídio foi suspenso do PT e que o senador será notificado pela comissão de ética do partido e, a partir daí, terá dez dias para apresentar sua defesa.
Reunida em São Paulo, a cúpula do PT definiu como estratégia, porém, desqualificar o teor das acusações, alegando que o senador está magoado com o partido. A decisão, até agora, é de não se manifestar formalmente e de responder apenas se for oficialmente questionado.
A informação sobre a delação caiu como uma bomba na reunião da executiva nacional do PT. O encontro foi convocado para debater estratégia para as eleições municipais. Mas a notícia mudou a pauta da reunião.
O Instituto Lula afirma, por meio de nota, que o ex-presidente "jamais participou, direta ou indiretamente, de qualquer ilegalidade, seja nos fatos investigados pela operação Lava Jato, ou em qualquer outro, antes, durante ou depois de seu governo".
Durante a cerimônia de posse de novos ministros, nesta quinta, Dilma criticou a delação de Delcídio. "Continuaremos defendendo que a presunção de inocência não pode ser substituída pelo pressuposto da culpa e nem dar lugar à execração pública sem acusação formal. E também à condenação sem processo por meio de vazamentos ilegais e seletivos."
"O combate à corrupção continua sendo uma prioridade em meu governo e nenhum governo realizou um enfrentamento tão duro e eficiente como o meu. E continuará sendo assim", disse Dilma.
A presidente ainda convocou uma reunião de emergência com seus assessores mais próximos no Palácio do Planalto para discutir os efeitos no governo das declarações do senador e a estratégia da presidente diante do assunto.
A ordem inicial no Palácio do Planalto é descredenciar Delcídio, repetir que ele falou mentiras "em outras ocasiões", e que, portanto, "não tem credibilidade" para dar informações. (Fonte: Folha SP/UOL)
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