A Venezuela tem enfrentado momentos de tensão desde o início de fevereiro, com protestos de estudantes e opositores contra o governo. A situação se agravou em 12 de fevereiro, quando uma manifestação contra o presidente Nicolás Maduro terminou com três mortos e mais de 20 feridos. Ao mesmo tempo em que milhares foram às ruas para criticar o governo – em um contexto de inflação, insegurança, escassez de produtos básicos e alta criminalidade –, outros milhares se manifestaram em favor de Maduro e contra os oposicionistas.
A situtação ficou ainda mais grave com outras três mortes confirmadas. A quarta vítima fatal foi um estudante atropelado terça-feira (18) durante os protestos na cidade de Carupanos. A quinta, confirmada nesta quarta-feira (19), foi uma ex-miss da Venezuela, morta por ter levado um tiro na cabeça na véspera. A sexta seria a mãe de um funcionário da VTV.
Após as primeiras mortes, governo e oposição trocaram acusações. Maduro acusou "grupúsculos fascistas" que teriam se infiltrado no protesto. Já o líder oposicionista Leopoldo López, que convocou seus partidários para irem às ruas, disse que o governo planejou a violência para tentar desacreditar seu movimento pacífico.
O governo acabou ordenando a prisão de Leopoldo López, e novos protestos foram convocados. López se entregou à polícia no dia 18 de fevereiro, em meio a novas manifestações.
As manifestações são como uma reedição da disputa política nas ruas que marcou os anos de governo de Hugo Cháveze a campanha eleitoral que levou Maduro a ser eleito em 2013, após a morte de Chávez.
O contexto atual também complica a situação do governo – os protestos ocorrem em meio a ausência de produtos industrializados nas prateleiras, similar ao início da crise política de 2002, e do controle das regras da economia para o setor empresarial.
Tentando controlar a crescente inflação, Maduro criou um decreto-lei “de preços justos”, que limita o lucro dos empresários locais a 30% sobre o valor da mercadoria. A escassez de produtos aumentou ainda mais após esta medida.
A seguir, saiba todos os detalhes dos duros protestos que marcam o mês de fevereiro na Venezuela.
1- Como começaram os protestos?
2 - Quem são os manifestantes e quais suas exigências?
3 - Qual o papel de Leopoldo López?
4 - Como seguiram os protestos?
5 - Como o governo reagiu?
6 - Qual o posicionamento internacional?
1 - Como começaram os protestos?
Estudantes simpatizantes da oposição, acompanhados de políticos, se reuniram no dia 12 de fevereiro na Praça Venezuela, no centro de Caracas, para criticar a política econômica de Maduro e exigir a libertação de universitários detidos nos dias anteriores em protestos no interior do país.
Enquanto isso, milhares de pessoas vestidas de vermelho, a cor do chavismo, se reuniram em diferentes praças em Caracas e em outros estados, para comemorar os 200 anos da chamada “Batalha da Vitória”, na guerra de independência do país. Nessa data é comemorado o “Dia da Juventude”, em homenagem aos que morreram em combate, e o evento deste ano foi transformado em um ato em defesa de Maduro.
A passeata chavista foi transmitida na íntegra pela televisão estatal, enquanto a dos opositores ganhou destaque em canais privados.
A repressão do governo contra os opositores no dia 12 causou a morte de três pessoas – dois estudantes e um líder comunitário governista.
Dezenas também foram presos – a promotoria venezuelana informou que dos 99 detidos, 73 foram libertadas até dois dias depois. A oposição, entretanto, afirmou que 47 pessoas permaneciam presas três dias após o protesto - a maioria estudantes universitários.
2 - Quem são os manifestantes e quais suas exigências?
Os manifestantes são liderados pelo dirigente político Leopoldo López (presidente do partido de direita Voluntad Popular), pelo prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, e por Maria Corina Machado, deputada ultraconservadora. Os dois últimos possuem imunidade parlamentar.
O objetivo deles é obrigar Maduro a renunciar a curto prazo. Os radicais querem uma “via rápida” para tentar tirar Maduro do poder, apostando na mobilização de estudantes antichavistas. “Ainda acreditam que devemos esperar até 2019 [fim do mandato de Maduro] para sair deste regime?”, escreveu López no Twitter ao convocar a primeira manifestação.
Os universitários venezuelanos são historicamente a vanguarda dos protestos de rua no país, e muitos de seus líderes chegaram a postos de poder.
Os protestos expõem divergências dentro da oposição, já que alguns líderes defendem uma posição mais moderada, e argumentam que as manifestações, quando se tornam violentas, acabam corroborando a tese governamental de que os oposicionistas são "sabotadores".
A tática nas ruas rendeu divergências com ex-candidato presidencial Henrique Capriles, até então visto como principal rosto da oposição. Capriles – líder do setor moderado da coalizão opositora – é contra a violência, mas também denunciou o governo por sua ação repressora contra os manifestantes.
As duas correntes diferem acerca do método com o qual devem se contrapor ao chavismo. Os moderados acreditam que é preciso reivindicar mudanças no Executivo, admitindo que foram derrotados nas urnas. Já os radicais querem mudar o governo de Maduro, não somente suas políticas.
A oposição também critica o apagão informativo na Venezuela, acusando o governo de estar por trás de uma "censura" nas redes sociais – além do controle do que é veiculado nas TVs, jornais e rádios.
3 - Qual o papel de Leopoldo López?
Leopoldo López, fundador do partido conservador Voluntad Popular, utiliza o radicalismo para projetar-se como uma nova liderança no interior da coalizão opositora, tentando tornar-se uma alternativa a Henrique Capriles, candidato presidencial derrotado por Maduro e até então principal rosto da oposição e dono de uma postura mais moderada.
Ex-prefeito do município de Chacao, ele vem de uma família da elite venezuelana, ligada ao setor industrial e petroleiro.
López vem convocando os protestos desde o início de fevereiro, e é um dos mais fervorosos defensores da derrubada de Maduro.
Após as mortes no dia 12, a Justiça venezuelana decretou sua prisão, por acusações que incluem terrorismo e homicídio.
Em um vídeo divulgado no dia 16, ele convocou uma nova passeata no dia 18 com direção à sede do Ministério de Interior e Justiça, disse que participaria da marcha e afirmou estar pronto para ser preso se isso for necessário. Ele acabou se entregando no dia 18.
Da prisão, ele fez um chamado para que os manifestantes continuem lutando pelo fim do governo chavista.
No mesmo dia, em uma audiência no local onde ele estava preso decidiu que ele vai permanecer detido por 45 dias, enquanto o Ministério Público investiga o caso.
As acusações iniciais de homicídio foram retiradas, mas ele ainda responde por incêndio e danos, além de instigação e associação para delinquir – em caso de condenação, a pena poderia ser de até 10 anos de prisão.
4 - Como seguiram os protestos?
Após a morte de três pessoas no dia 12 de fevereiro, manifestantes voltaram às ruas em praças de Caracas e outras cidades venezuelanas.
No dia 14, manifestantes foram dispersados por guardas nacionais com bombas de gás lacrimogêneo e jatos d'água, depois de bloquearem duas movimentadas avenidas.
No dia 15, cerca de 3 mil opositores protestaram em Mercedes, zona de luxo da capital.
As forças de segurança usaram gás lacrimogêneo e balas de borracha para dispersar um grupo de estudantes que protestava contra a prisão de manifestantes antigoverno, e mais de 20 pessoas ficaram feridas.
No domingo (16), milhares de opositores voltaram às ruas, com a presença da deputada María Corina Machado e do prefeito metropolitano de Caracas, Antonio Ledezma. Eles rejeitaram a violência dos dias anteriores e pediram que os manifestantes denunciem os “baderneiros infiltrados”.
Após dias de manifestações, o ministro do Interior, Miguel Rodríguez Torres, informou que das 120 pessoas que foram detidas por incidentes em todo o país, 14 ficaram presas e serão processadas pelo incêndio de veículos da polícia, pela agressão a funcionários e porte de armas de fogo.
No dia 18, uma nova grande manifestação foi convocada, e milhares de pessoas foram às ruas. Leopoldo López se entregou à polícia no mesmo dia, causando comoção popular. A oposição prometeu manter os protestos.
Os protestos do dia 18 fizeram ainda mais uma vítima fatal. A ex-miss Turismo Carabobo 2013 Génesis Carmona. Ela tinha 22 anos, levou um tiro na cabeça e morreu nesta quarta-feira.
Além dos mortos, houve muitas agressões à imprensa - pelo menos 31 jornalistas foram reprimidos, detidos e roubados na Venezuela por efetivos das forças da ordem e por desconhecidos, durante os protestos, denunciou o Sindicato Nacional de Trabalhadores da Imprensa (SNTP),
Na noite do dia 19, centenas de manifestantes venezuelanos voltaram a ser dispersados pela polícia no setor opositor de Chacao, no leste de Caracas.
5 - Como o governo reagiu?
Maduro classificou como tentativa de "golpe de Estado" os incidentes que deixaram três mortos durante protestos no dia 12 de fevereiro. O presidente denunciou que os protestos opositores constituem um "golpe de Estado em desenvolvimento" contra seu governo, e alegou ter usado a força policial para impedir manifestações que não estejam autorizadas, assim como bloqueios das ruas.
A declaração foi dada em um exaltado discurso transmitido por rádio e televisão, no qual prometeu que "a revolução bolivariana vai triunfar". O presidente disse ter dado "instruções muito claras às forças de segurança (...) que quem sair para tentar exercer violência sem permissão para mobilização será detido".
No dia seguinte, um tribunal ordenou a prisão do líder oposicionista Leopoldo López por acusações que incluem assassinato e terrorismo.
Maduro o acusa de buscar a violência para tentar dar um golpe similar ao que 12 anos atrás tirou do poder por breve período o falecido presidente Hugo Chávez, embora haja poucos indícios de que os protestos possam derrubá-lo.
O presidente venezuelano também afirmou que o ex-presidente colombiano Alvaro Uribe está por trás das manifestações opositoras no país ao lado do canal de notícias colombiano NTN24, que fez uma ampla cobertura dos protestos.
Maduro também acusa os EUA de confabularem com a oposição para depor o seu governo, tanto que no dia 16 anunciou a expulsão de três funcionários consulares norte-americanos.
6 - Qual o posicionamento internacional?
Após as mortes, a Alta Representante da União Europeia (UE) para a Política Externa, Catherine Ashton, expressou sua preocupação pela situação da Venezuela e pediu às partes que desenvolvam um “diálogo pacífico”.
No dia 15, o Departamento de Estado dos Estados Unidos também manifestou sua "preocupação" com a tensão na Venezuela.
No dia 17, o governo norte-americano chamou de "falsas e sem fundamento" as acusações do governo da Venezuela de que Washington está colaborando com os protestos neste país. O presidente Barack Obama condenou a violência, classificada de "inaceitável".
O governo do México lamentou a violência e pediu o diálogo para resolver as diferenças.
Entre os que apoiam Maduro, o presidente boliviano, Evo Morales, disse que o "imperialismo norte-americano" e a "oligarquia" venezuelana financiam os jovens que protestam na Venezuela para tentar acabar com a revolução de seu colega Nicolás Maduro. (Fonte: G1)
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