O LADRÃO DE VOTOS, capítulo III
Quando Margot e Jandira chegaram para votar e não encontraram a urna, houve um desentendimento entre estas Cidona e Xaninha, quase chegando às vias de fato e bate- boca intenso.
- Vocês estão com armação – cadê a urna?
- Sinceramente não sei, todas aqui votaram e a urna encontrava-se ai, bem em cima do Enrugadão.
- Ooooooooooooooqqqqqquuuuuuuueeeeeeeeeeeeee? Ainda essa, votar em cima desse fdp.
- Vocês fazem a gente levantar-se de madrugada, nesse frio, para votar, e nada, olhe bem o que vocês estão aprontando prá nós.
- Furtaram a urna!
- Furtaram ooooooooooqqqqqqqquuuuuuuuueeeeeeee?
- A urna.
Nesse momento retorna ao local o delegado Dr. Grilo, Saladão, Armando Rolo o prefeito, o cirurgião plástico Dr. Pelanca, e Verinha, secretária do executivo.
- Furtaram o que? Perguntou Dr. Grilo.
- Nada doutor, foi engano...
- Engano o caralho, ouvi bem e não acreditei, furtaram uma urna eleitoral?
- Oooooooooooooooquuuuuuuuuuuuueeeeeeeeee, urna eleitoral no velório? Prefeito Armando Rolo estava indignado.
- Exatamente doutor.
- Vocês beberam demais.
- Não doutor furtou sim uma urna da daqui do peito do Enrugadão.
- Puts, eu bebi bastante essa noite, mas vocês é que ficaram bêbadas. Como isso é possível? Não estamos em época de eleição, aqui não existe nenhuma cabine indevassável, não estou entendendo nada. Ou melhor, estou entendendo bem, vocês criam uma brincadeirinha para tornar a trepada mais erótica, imprevisível, como numa urna eleitoral?
- Doutor o senhor está brincando com coisa séria.
- Vocês é que quer me deixar louco, inclusive na frente do Prefeito Armando Rolo e das demais personalidades aqui presentes. Eu já vi de tudo na zona, certa feita encontrei um freguês vestido de Papai-Noel; mas urna eleitoral em velório, de madrugada, é muito para minha cabeça; vocês se superaram a loucura aqui é total, a realidade supera em muito a ficção.
Após uma breve pausa Dr. Grilo continua falando, não deixando ninguém falar.
- E os pior, vocês querem me fazer acreditar que a urna foi furtada daqui de dentro; quem faria isso? E pra que uma urna nesta hora e nessa altura do campeonato? Quem é o candidato?
- Aqui não é seção eleitoral, nunca houve cabine indevassável por aqui, para vocês votarem...
- Seria uma boa. (Armando Rolo).
- Doutor é difícil explicar pro senhor o que estava acontecendo aqui, é melhor o senhor aceitar os fatos sem questionar. (Xaninha).
- Ooooooooooooooqqqqqqqqqqquuuuuuuuueeeeeeeee?
Você deve estar pensando que eu sou xarope, irresponsável, não penso, não tenho responsabilidades com a função policial; se bem que, se não derem queixa do furto da urna eu não posso agir, é como se não existisse pra mim, mas o que é muito estranho é... Mas havia uma eleição aqui para decidir o que?
- Ainda é segredo doutor, não podemos revelar. (Cidona).
Nesse momento Armando Rolo entra na conversa desconfiado de que estariam confabulando, conspirando contra sua administração, tipo forças ocultas para derrubá-lo, por isso, o segredo.
- Exijo já que se esclareça o segredo. Se perdurar essa situação por mais de 48 horas, eu vou criar um pedágio urbano dificultando o acesso à zona; vou fechar essas pocilgas, quero ver se vocês podem comigo? (Armando Rolo).
- Pedágio pra vir na zona? É ruim heim, é muito criativo esse brocha corno, demagogo, novo rico, corrupto. (Xaninha, resmungando).
- Exa, o problema não é com o senhor.
- Como não é comigo; eu sou o único eleito pelo povo pra governar os destinos dos Cheirosinhos nos próximos anos, e pretendo me re-eleger. E essa urna aqui está mal explicada, com esse morto aqui, que sempre me fez oposição, eu queria entender. Grilo exijo que você tome providências, descubra quem furtou a urna, acredito que o suspeito numero um é o próprio morto, prenda-o e leve-o para a cadeia pública. (Armando Rolo).
- Eu não posso prender um morto. (Dr. Grilo).
- Não tem competência pra isso? (Armando Rolo).
- Competência eu tenho, o morto é que não é capaz de praticar um furto, nessa situação de defunto, cadáver, mortinho, inerte, duro. (Dr. Grilo).
- Como um morto não poderia praticar o furto? Prenda ele assim mesmo, assim você terá um suspeito. (Armando Rolo).
- Acho que vocês todos estão muito bêbados, não é possível ouvir tanta besteira, e o que é pior estão desrespeitando o cadáver. (Ritona).
Nesse momento retorna ao velório Conde e Tanajura e se postam do lado do caixão.
Dr. Pelanca, o cirurgião plástico, também se aproxima do caixão e olha detalhadamente o corpo inerte de Enrugadão. Após, faz alguns comentários:
- Aqui dava pra fazer uma lipo, apontando pra barriga, aqui, apontando pra testa dava pra fazer uma mini- lifting.
No velório estão todos exaltados, falando alto e ao mesmo tempo.
- Ele vvvvvvvoooooommmmmitttttoooouuuuu! (Conde).
Como que por encanto, todos se calam e concentram suas atenções no defunto.
- Ooooooooooooqqqqqqqqquuuuuuuuuue, exclamou Ritona, aproximando-se de um sofá, para desmaiar sentada.
- Ele vomitou, ressuscitou como Cristo, bradava histericamente Conde.
- Impossível, ele está mortinho, afirmou Dr. Saladão, ginecologista-vegetariano da zona, que examinou e atestou a morte do Enrugadão.
- Ele de fato vomitou cachaça pura. Operou-se um milagre aqui, gritava Conde, num ataque de bichice; seguido por Tanajura, que já estava desmaiada no chão.
- Deixa essa viadagem pra lá, vamos remover esse cadáver pra fora, acho que, com um pouco de ar puro, ele volta... (Dr. Grilo).
E o cadáver foi colocado pra fora.
Por alguns instantes ficaram todos fora da casa, ao lado do caixão com o defunto, na esperança que ele ressuscitasse.
Armando Rolo, arrependido do que dissera anteriormente, e querendo remendar sua fala, aproximou-se de Cidona e falou baixinho, com a mão em conchinha no seu ouvido.
- Vou mandar hoje mesmo um decreto propondo nome de rua pro Enrugadão.
- Está louco? Esse aí só serve pra dar nome ao lixão. (Cidona).
- Será que é alguma mensagem que ele quis nos mandar com essa vomitada no estilo de Gastão, “o Vomitador”, (Pasquim), que foi criado para demonstrar todo seu nojo e inconformismo com o que estava ocorrendo politicamente no país, naqueles tempos? (Xaninha).
- É bem provável que ele tenha ficado indignado pelo fato de hoje não ter uns bate-coxas ou umas bimbadinhas. (Dr. Grilo).
- Porra doutor, o senhor tem que dar exemplo, mas é o mais profano dos seres humanos que conheço. (Cidona).
- Na hora do bem bom, você me chama de outra coisa, né minha florzinha. (Dr. Grilo).
- Chega, vou entrar se não fico gripada. (Cidona).
Enquanto caminhava para o interior da casa, Cidona sentia que a ficha estava caindo, precisava desse resultado eleitoral para informar Mami, que esperava do outro lado da rua, dentro do taxi, pelo veredicto. Tinha enchido o saco de todo mundo, e agora?
Todos se recolheram dentro da casa, abandonando o defunto lá fora, na friagem.
Mami vendo toda aquela movimentação e sem entender nada se aproximou da casa sem ser notada e foi entrando devagar.
- Milagre, outro milagre hoje, profetizava Tanajura, desmaiando de novo.
- Não estou entendendo mais nada. Agora sim estou sentindo as coisas saírem do meu controle; estamos em outra galáxia, num plano espiritual. (Dr. Grilo).
Os presentes todos incrédulos, assustados, estavam estáticos.
- Você encarnou quando, Mami? (Saladão).
- Na mesma data que sua mãe.
Wagner Sampaio é advogado
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