Era recém casado quando a esposa falecera, tiveram uma vida em comum maravilhosa e de repente essa zebra.
Porém, a sua natureza insistia em viver, sentia que tinha algo que o incomodava. Quando acontecia, tomava um banho frio e a coisa logo passava. Ultimamente, nem banho frio resolvia mais, tinha que pensar em algo mais violento, por exemplo: “juros bancários, ministros da Dilma”; aí sossegava.
Certo dia, resolveu dar uma volta; iria até a banca ou ao bar próximo, onde tomaria um café expresso, comeria um pastel de palmito e um sorvete de groselha.
Estava inseguro. Tomou o elevador, começou a descer, porém este parou no 15º andar, onde entrou Cris, a vizinha que fora eleita a “bunda mais perfeita daquele verão.”
Ela saía para fazer cooper; trajava um colante salmão, 10 números menores que seu manequim. Na frente do colante, na região pubiana possuía um desenho de um cachorrão rotwailler com a bocarra aberta, exibindo os dentes afiados, serrados, e nas nádegas dois bassets.
Esses animais davam a impressão de serem mais ferozes naquela roupa diminuta; o rotwailler e os bassets provocavam terror no nosso herói.
De repente, o elevador estancou com falta de energia; ficaram no escuro, só um pequeno feixe de luz os iluminava.
José, temeroso com o inusitado, encostou-se no fundo do elevador; com o breque brusco e a escuridão, a vizinha desequilibrou-se, rodopiou, quase caiu, trombou com José.
Na penumbra do ambiente e a confusão mental que vivia, José teve a impressão que o rotwailler avançava sobre si. Encostado no fundo tentou recuar mais, não tinha para onde fugir dos cães, não teve dúvidas, segurou o rotwailler pela boca com uma mão e com a outra segurou um basset.
Enquanto Cris equilibra-se, José dominava os cachorrões. Quando equilibrou-se e dominou suas ações, a prendada segurou José pelo rosto com as mãos e lhe beijou o lábio inferior, depois o superior, em seguida como que possuída num turbilhão selvagem, passou a beijá-lo e sugá-lo desesperadamente.
José correspondia, e num piscar de olhos estavam deitados no elevador, ele acariciando os cachorrões, enquanto Cris procurava o freio do seu nervo teso.
Não perceberam que a energia havia voltado, o elevador desceu; só descobriram o que ocorria quando a porta do mesmo se abriu no térreo, e o prédio inteiro estava ali, esperando para subir, inclusive o maridão da Cris.
Cris levantou-se, se recompôs, arrumou o cabelo, o colante, o sutiã, o elástico da calcinha, pegou os objetos pessoais no chão, respirou fundo, vez beicinho e falou:
- Beeeemmmmmmmmm, ele me assediou.
Cinquentinha, o policial meio corrupto, o prendeu e o levou para o plantão policial, onde foi autuado e recolhido ao xadrez.
Dias depois, sua mãe foi visitá-lo; levou-lhe cuscuz de sardinha, tubaína gelada, pão com mortadela, queijadinha, doce de amendoim e duas bananas.
- Mãe, a senhora sabe que eu não como tanto.
- Olha o jornal seu cachorro!
A manchete falava por si: “José, 37, preso por tentar violentar a vizinha”.
Estava ali na manchete em letras garrafais. Se transformara em José, 37.
Estava acabado, não tinha mais jeito, precisaria mudar de prédio, de cidade, talvez do país, descer do mundo.
Triste fim para José, 37.
Quando a hora da visita terminou e a mãe foi embora, adormeceu. Acordou, sorveu uma caneca de café e começou a repensar os problemas: cachorro que late não morde, aqueles não latiram, logo, queriam lhe morder e o atacaram. Era a deixa que precisava; agira em legítima defesa aos ataques, relataria esses fatos ao seu advogado.
Sossegou, começou a viajar no pensamento: aqueles momentos com a vizinha foram os melhores de sua vida nos últimos anos; após segurar os cachorrões, ela tomara a iniciativa, sim foi ela que veio pra cima beijando-o. Beijo verdadeiro. Os cachorrões dominados eram um manjar dos Deuses, era aquele chopp do Giovanetti, geladíssimo, copo suado, que desce muiiiiiiittttoooooo redondoooooo, num dia de calor tropical, ouvindo ao fundo uma batucada de respeito; era como que um lançamento de 40 metros do Gerson, para Jairzinho “O Furacão da Copa”, voar como um beija-flor, dominar a bola no peito, em pleno vôo, e estufar a rede adversária; era muito, era demais de ótimo (...)
Reavaliou os fatos e começou a arquitetar: talvez a cadeia não fosse tão ruim; convidaria Cris para vir visitá-lo e se rolasse algo, como no elevador, não sairia mais dali, e a esperaria eternamente para adestrar a cachorrada.
Quem não arrisca não petisca, e que petisco! De repente um grilo: como continuaria na cadeia se ela o perdoasse? Inventaria que matou alguém no passado, mas quem? Inventaria algo grandioso, um político importante. Mas quem? Pensou, pensou. Diria que fora o responsável pela queda do helicóptero do Dr. Ulisses, “o cidadão Diretas”, lá em Angra dos Reis. Ninguém duvidaria.
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