"A PROPÓSITO DO 1.º DE ABRIL"
Poética – Manoel Bandeira
Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto, expediente, protocolo e manifestação de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que para e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas.
Todas as palavras, sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis.
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo.
De resto não é lirismo
Seja contabilidade tabela de co-senos secretario do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar as mulheres etc.
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
(Poesia e Prosa, p. 188/9, v.I, Rio, 1958).(Clowns = palhaços).
Wagner Sampaio é Advogado
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